quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Responsabilidade do tomador de serviços na terceirização

A aluna Simone Mendonça fez interessante pergunta nos comentários à postagem retrasada. Para dar maior publicidade à dúvida, que pode ser de muitos, resolvi publicá-la, juntamente com a resposta, nesta postagem. Quaisquer observações, etc., podem ser feitas nos comentários, como sempre.
Questão de Simone:
Professor, o senhor foi muito claro, mas acho que eu não fiz a pergunta direito, então vamos lá: Digamos que o tomador de serviços tenha firmado contrato com uma terceirizada de vigilância. Esta, no entanto, demite alguns empregados sem justa causa, deixando todos com salários atrasados, e sem receber qualquer verba rescisória... Digamos ainda que essa terceirizada não seja localizada para responder ao processo e que o tomador de serviço, participando como litisconsorte passivo, seja condenado subsidiariamente. Julga-se e tem-se a condenação ao pagamento dos salários atrasados (5 meses) e etc.... Restará ao Tomador de Serviço, além da condenação, o respectivo recolhimento de verbas previdenciárias ao tempo que essas deveriam ter sido recolhidas pelo empregador principal? Devendo arcar ainda com os juros de mora a elas correspondentes?

A minha dúvida reside em identificar sobre quais verbas, presentes ou passadas, essa súmula irá atingir. Pois ao falar do Reclamante principal, nada mais justo do que ele arcar tais encargos, mas ao analisar a situação do tomador de serviço (litisconsorte passivo), parece-me injusto?!!
Grata!
Resposta:
Cara Simone e demais alunos,

Obrigado por mais esta pergunta. Segue a resposta, o mais objetiva possível:

1. O tomador se responsabiliza por tudo (todo o montante da condenação), caso o empregador não cumpra com a obrigação. Trata-se, portanto, de responsabilidade subsidiária, que é a solidária, só que com benefício de ordem.

2. Pode parecer-lhe estranho (ou, talvez, injusto, como você o disse) porque talvez você tenha se lembrado do art. 265 do CC, segundo o qual “A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes”. Como da vontade das partes, na terceirização, muito dificilmente resultará, resta-nos investigar se há previsão legal para tal.

3. Com efeito, o verbete de súmula 331, IV, do TST, que diz que “O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços (...)”, não é uma lei, mas apenas um posicionamento jurisprudencial, do qual não se pode extrair a exigência de lei para a solidariedade, nos termos do mencionado art. 265 do CC.

4. Na prática, contudo, a maioria das pessoas simplesmente não se atenta para este detalhe e apenas aplica a S. 331 do TST, sem maiores questionamentos.

5. Mesmo sendo rigoroso, ou seja, exigindo-se a previsão legal para a soliariedade, penso ser possível argumentar que, pela lei, pode-se responsabilizar o tomador de serviço. Vejamos.

6. Se o caso for de intermediação ilícita de mão de obra (chamada por alguns de terceirização ilícita), aplica-se diretamente o art. 9º da CLT, estabelecendo-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador. Todos respondem solidariamente. Esse, contudo, não foi o exemplo que você trouxe na sua pergunta.

7. Sendo o caso de terceirização (intermediação lícita de mão de obra), que é o exemplo que você apresenta na sua pergunta, o ponto inicial do argumento é o seguinte:

7.1. Um tomador de serviço que terceiriza mão-de-obra de empresa que não honra com os créditos trabalhistas de seus empregados certamente não escolheu bem a empresa por meio da qual terceirizar o seu serviço. Tal tomador, de forma manifesta, excedeu os limites sociais do seu direito de terceirizar, ou seja, praticou abuso de direito.

7.2. Veja o que diz o art. 187 do CC: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes” (CC, art. 927).

7.3. Ora, daí conclui-se que o tomador, no caso, cometeu ato ilícito. Como “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, o tomador deverá fazê-lo.

7.4. Mas, até agora, ainda não vimos a alusão a solidariedade, certo? É aí que entra o art. 942 do CC, segundo o qual “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação”.

8. Pronto, eis a previsão legal exigida pelo art. 225 do CC para que tenhamos a solidariedade. Por esse prisma, a súmula 331 do TST se torna até benéfica ao tomador, pois dá a ele o benefício da ordem, quando a lei nem toca neste ponto, não acha?

Um abraço,
Lycurgo

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