Questão:
Olá professor,estudando para poder responder a questão quanto à revelia no processo do trabalho, estava a ler um artigo publicado por Maria Vitória Ribeiro Terra Franklin e ela ao falar de perempção se refere ao Art. 732 (os dois arquivamentos ocasionam a penalidade dos 6 meses e etc.) e posteriormente ela diz: "Vai mais além o Código de Processo Civil, quando, em seu Art. 268, registra a perda do direito de ação à parte que der causa a três arquivamentos pelo abandono da causa por mais de 30 dias." Dando a entender que com isso no caso de haver uma terceira hipótese de arquivamento (como o abandono por 30 dias) haveria a perempção na causa trabalhista nos moldes da descrita no art. 268 do CPC. O sr. acha que isso seria possível na seara trabalhista? Ou seja, no caso de duas causas de arquivamento se aplicar o art. 732 da CLT e na terceira hipótese de se arquivar ser aplicado de forma subsidiária o CPC com o seu dispositivo 268, o que ocasionaria a extinção do processo sem julgamento de mérito (art. 267) - mesmo que esta pena seja mais gravosa que a prevista no CPC - por haver agora perempção nos moldes do processo civil? Não sei se essa questão seria cabível de ser discutida no blog, mas, até para não tumultuar o "post" da questão preferi abordá-la por e-mail mesmo.Att.,Lauro Ericksen
Caro Lauro e demais alunos,
Com as vênias de praxe aos que diferentemente pensam, creio que não se aplicam ao processo do trabalho o parágrafo único do art. 268 combinado com o inciso III do art. 267, todos do CPC, segundo os quais se tem que, se o autor der causa, por três vezes, à extinção do processo por abandonar a causa por mais de trinta dias, não promovendo os atos e diligências que lhe competir, não poderá intentar nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito.
O fundamento para a não aplicação da perempção do CPC é o de que há regramento próprio para a matéria na CLT, especificamente nos artigos 731 e 732, de acordo com os quais, aquele que, tendo apresentado ao distribuidor reclamação verbal, não se apresentar, no prazo de cinco dias, à Vara do Trabalho para fazê-lo tomar por termo, assim como aquele reclamante que, por duas vezes seguidas, der causa ao arquivamento dos autos em razão do não-comparecimento à audiência, incorrerá na pena de perda, pelo prazo de seis meses, do direito de reclamar perante a Justiça do Trabalho.
É dizer, portanto, que a existência da perempção trabalhista impede a aplicação da perempção do CPC, visto que não há omissão quanto à matéria, que justificaria, nos termos do art. 769 da CLT, a aplicação subsidiária do CPC.
Por outro lado, há doutrinadores de nomeada que defendem a idéia de que a perempção celetista difere-se ontologicamente da do CPC, ou seja, de que o que a CLT penaliza é algo diferente do que é penalizado pelo CPC, de maneira que não haveria coincidência das matérias tratadas pelos dois códigos e, portanto, a CLT seria omissa naquilo que aborda o CPC, viabilizando, assim, a aplicação subsidiária deste.
Tenho para mim, contudo, que mesmo que a idéia da diferença ontológica seja defensável – e, com efeito, em certo sentido é – o art. 268 do CPC ainda não poderia ser aplicado, mas agora por outro argumento. É que, embora a perempção do CPC e a da CLT apresentem penas diferentes (a primeira, a de não mais poder intentar nova ação contra o réu com o mesmo objeto, e a segunda, a de perda, pelo prazo de seis meses, do direito de reclamar perante a Justiça do Trabalho), ambas decorrem do mesmo fato, qual seja, o arquivamento dos autos (embora a lei fale em arquivamento da ação, esta é direito público do autor, não susceptível a arquivamento; portanto, os autos é que são arquivados).
Em outras palavras, ambas as perempções são decorrentes da repetição da extinção do processo sem julgamento do mérito, arquivando-se os autos por culpa do autor, de forma que, aplicar a pena do CPC pelo terceiro arquivamento é considerar os dois arquivamentos prévios que já foram contabilizados para aplicação da pena da CLT. Isso, a meu sentir, configura injustificável condenação por duas vezes em decorrência de mesmo fato, já que, repito, os dois arquivamentos causadores da perempção celetista passariam a compor os três necessários à perempção do CPC. Assim, em respeito ao princípio geral do direito do non bis in idem, que se aplica não apenas à esfera penal, mas também à não-penal (cível, trabalhista e administrativa), a perempção do CPC não poderia ser utilizada mesmo se vencido o argumento da ausência de lacuna.
Um aspecto igualmente relevante da análise da perempção, o qual não foi trazido pela pergunta do Lauro, mas que, por certo, é de importância para o estudo, é o de se saber se e quando se dá a interrupção e suspensão da prescrição em decorrência da perempção trabalhista. Alguém se habilita a responder nos comentários? Se houver tentativas de respostas, prometo posicionar-me. Por ora, sugiro a leitura do julgado cuja parte transcrevo abaixo, que pode jogar alguma luz sobre o problema.
Destaque-se que a parte autora não se desvencilhou do encargo de provar que o ajuizamento das reclamações RE.01.001.01026/00 e RE.09.001.01515/00 tiveram o condão de interromper o prazo prescricional em relação aos pleitos que constituem o objeto da presente ação, haja vista que não apresentou as correspondentes petições iniciais a fim de demonstrar a identidade com aqueles pedidos que então fizeram parte do objeto de tais ações trabalhistas. “Interrupção da prescrição – Reclamatória anterior arquivada – Prova. Para que o reclamante possa ser beneficiado com a interrupção da prescrição, resultante de reclamatória arquivada anteriormente, deverá comprovar tal fato durante a frase instrutória, sendo inservível para o fim colimado, a juntada de tais documentos com as razões recursais, diante da orientação jurisprudencial estampada no Enunciado n. 8 do C.TST” (TRT da 12ª Região, 1ª Turma, RO 8720/93,DJ SC 16.9.94, p. 50, Rel. Juiz António Martini).
Todavia, o segundo arquivamento de reclamação trabalhista em virtude do não comparecimento do autor, quando da audiência inicial, acarretou a aplicação da penalidade prevista pelo art. 732 da CLT, que trata da perempção no processo trabalhista. Portanto, houve absolvição de instância com a perda temporária do direito de ação do obreiro durante o prazo de seis meses a contar do segundo arquivamento. Destaque-se que a perempção atinge o direito de ação quanto a todos os eventuais créditos decorrentes do contrato de trabalho, mesmo que os pleitos não tenham integrado o objeto das ações precedentes. Afinal, “a penalidade não se restringe à hipótese de ajuizamento de ação idêntica. Suspende, por seis meses, o direito da parte de acionar a máquina jurisdicional trabalhista de forma geral, independentemente da pessoa do demandado e do objeto da reclamação. Não se trata de perempção, mas de uma impossiblidade temporária do exercício do direito de ação, em face da contumância do reclamante. O direito de ação é público e subjetivo, garantido constitucionalmente, mas jamais será ilimitado. Todos os direitos garantidos ao cidadão terão seu exercício regulamentado, não só para evitar abusos, como para preservar o próprio ordenamento jurídico e a sociedade” (DAMASCENO, Fernando A.V., e CALLADO, Adriane, “Petição inicial – Requisitos”, IN Revista Síntese Trabalhista N° 74, AGO/95, p. 9). Consequentemente, independente de haver identidade quanto ao objeto dos processos RE.11.001.00889/99, RE.01.001.01026/00 e RE.09.001.01515/00, o ajuizamento de tais ações trabalhistas não possuiu o condão de interromper o prazo prescricional por força do disposto no art. 175 do Código Civil, haja vista que então se encontrava em curso o prazo correspondente à perempção.
Ademais, frise-se ser ilógico que a pena de perempção ocasione o benefício de suspensão do prazo prescricional. Afinal, trata-se de uma punição – aplicada como sanção à desídia do empregado que duas vezes seguidas provocar a tutela da Justiça do trabalho e der azo ao arquivamento da ação em decorrência do seu não comparecimento à audiência inicial. Portanto, não se pode subtrair os seis meses do curso da pena advinda da perempção quando do cálculo do prazo bienal previsto no art. 7°, XXIX, da Magna Carta.” Prescrição. Se o empregado deu causa ao arquivamento de ação por duas vezes consecutivas, sendo-lhe por isso aplicada a penalidade de que cogita o art. 732 da CLT, o prazo de seis meses da perda do direito de reclamar perante a Justiça do Trabalho deve ser adicionado ao tempo decorrido entre a despedida e o ajuizamento da ação para efeitos de contagem de tempo prescricional.” (TRT da 12ª Região, 2ª T., RO1572/94. DJSC 30.9.94, p.54, Rel. Juiz Umberto Grillo).
Em suma, conclui-se que o reclamante não se desvencilhou do encargo de provar a ocorrência de interrupção da prescrição quanto ao direito de ação relativo aos pedidos remanescentes. Primeiro, porque não comprovou que integraram o objeto das ações autuadas sob os N° RE.01.001.01026/00 e RE.09.001.01515/00. Segundo, porque os processos RE.11.001.00889/99, RE.01.001.01026/00 e RE.09.001.01515/00 não poderiam interromper o cutelo prescricional porque então se encontrava perempta a ação.” (fls. 1051/ 1052).Por oportuno, convém frisar que é correta a assertiva do autor com relação à alegação de que a contagem do período imprescrito conta-se da propositura da primeira demanda (23.08.2000), porém não lhe socorrendo tal assertiva, já que não consta dos autos a petição inicial da ação a que se refere, a fim de se verificar os pedidos ali formulados.
Assim, o arquivamento de reclamação anterior tem o condão de interromper a prescrição. Todavia, para que isso ocorra é necessário, imprescindível mesmo, que exista identidade entre a ação arquivada e a atual, ou seja, com as mesmas partes, pedido e causa de pedir (inteligência do Enunciado nº 268 do C. TST), não merecendo nenhum reparo a decisão de origem.
Saliente-se que, de acordo com os demais dispositivos legais pertinentes à matéria, a prescrição só é interrompida com relação às pretensões veiculadas na ação arquivada, o que na presente hipótese, não se pode comprovar à falta de elementos.
Nestes termos, se conclui, inequivocamente, que, no caso sub judice, o termo a quo do prazo prescricional se iniciou quando da extinção do contrato de trabalho, que integrado o prazo do aviso prévio se deu em 01.07.1999, momento em que a suposta lesão alegada pelo recorrente se configurou, desse marco surgindo o início do referido prazo. Como as ações posteriormente ajuizadas não tiveram o condão de interromper o prazo prescricional, o prazo para ajuizamento da ação se encerrou em 01.07.2001. Como a presente ação apenas foi protocolada em 08.11.2001, correta a sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, em razão da prescrição bienal.
Lycurgo
5 comentários:
Prof., realmente interessante a questão da prescrição.
Tanto assim, que gostaria de dirigir-lhe uma dúvida - embora incerto de este ser o meio adequado -, a qual se relaciona diretamente à prescrição e à ampliação da competência da justiça laboral, realizada pela EC 45/04.
Trata-se de caso prático:
01. Em 28.01.05, buscando indenização por danos morais, materiais e estéticos, João ingressou com ação na justiça comum contra a empresa XXX, onde havia trabalhado até 12.11.1997.
02. A ação tramitava na vara cível até que o STF, no jugalmento do Conflito de Competência nº 7204, em 29.06.05, ao interpretar a nova redação dada ao art. 114 da CF pela EC 45/04, entendeu que ações de indenização fundadas em acidente de trabalho e propostas por empregado contra empregador seriam da competência da justiça do trabalho.
03. Observando a nova diretriz jurisprudencial do STF e sendo o dano decorrente de relação trabalhista, o juiz de direito determinou a remessa da ação à justiça do trabalho, para que lá prosseguisse seu processamento, com a finalização da instrução processual.
04. Quando o processo tramitava na justiça do trabalho, o advogado da empresa argumentou ter ocorrido, no caso, a prescrição, o que foi rebatido pelo autor, sob o argumento de que a lei civil então em vigor previa o prazo de 20 anos para o ajuizamento das ações pessoais.
Dois são os questionamentos propostos: (a) norma aplicável ao caso, se civil ou trabalhista, e (b) ocorrência, ou não, de prescrição do direito de ação do autor.
Quanto à letra "a", parece-me inquestionável a aplicação da legislação civilista, relacionada à responsabilização civil do empregador (arts. 927 e segs. do CC/02).
Quanto à letra "b", pesquisei na jurisprudência do TST, a qual parece estar-se pacificando pela aplicação da prescrição trabalhista (art. 7º, inciso XXIX, da CF). Porém, no caso de ação proposta anteriormente à EC 45/04, por razões de segurança jurídica, deve-se aplicar o prazo prescricional civil, inclusive com a regra de direito intertemporal (art. 2028 do CC/02).
Contudo, a presente questão trata de ação ajuizada pouco tempo depois da entrada em vigor da EC 45/04 (30.12.04) e anteriormente à decisão do STF acima mencionada (29.06.05).
Não encontrei nenhuma decisão tratando de caso idêntico ou, ao menos, semelhante.
Na sua visão, qual seria a resposta adequada?
Esqueci de me identificar no questionamento acima.
Lauro Tércio B. Câmara.
Mat. 200338692
Professor,
Tendo entrado com duas ações, sendo que ambas foram arquivadas por não comparecimento, segundo o artigo 732 só poderia entrar com nova ação depois de 6 meses. Posso entrar com outra ação antes deste prazo, para fugir da prescrição bienal, já que a prescrição será interrompida? Sendo assim, posso entrar com a nova ação logo após a extinção da terceira?
Professor,
Tendo entrado com duas ações, sendo que ambas foram arquivadas por não comparecimento, segundo o artigo 732 só poderia entrar com nova ação depois de 6 meses. Posso entrar com outra ação antes deste prazo, para fugir da prescrição bienal, já que a prescrição será interrompida? Sendo assim, posso entrar com a nova ação logo após a extinção da terceira?
Amigo(a),
Por questões profissionais, não respondo a consultas de casos pelo blog, mormente quando a postagem é de anônimo.
Att.,
Lycurgo
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